Devido a atualidade e importância, a nova Lei de Abuso de Autoridade será o tema do VII Debate do Fisco
A aprovação no Congresso Nacional da Lei de Abuso de Autoridade ainda gera muita polêmica, porque prever duras penas para quem cometer o abuso de autoridade. A lei anterior datava de 1965 e evidentemente necessitava de atualização. Para muitos estudiosos e instituições a nova legislação representa um grande avanço para enfrentar e coibir o cotidiano de arbitrariedades. Para outros, a mesma lei colocará obstáculos para o exercício pleno de atividades do juiz, do policial e ou dos servidores da atividade fiscal, por exemplo
Devido a atualidade e importância do assunto, a diretoria do Sindicato Fisco de Sergipe (Sindifisco/SE) elegeu o tema “Lei do Abuso de Autoridade: seus efeitos práticos e como ela afetará a vida dos auditores tributários” para o VII Debate do Fisco. O evento será nesta quarta-feira (23), às 09h, no auditório da Secretaria da Fazenda de Sergipe (Sefaz). O palestrante será o assessor jurídico do Sindifisco, Guilherme Sobral.
A partir de 2020, entrará em vigor a Lei de Abuso de Autoridade e valerá para todas as autoridades, do Judiciário, do Executivo ou do Legislativo, e significa a subordinação de todos à lei (poderosos e cidadãos comuns). A ideia é garantir o direito do cidadão diante de eventual abuso da força por um agente do Estado.
Depois de dois anos engavetada, a tramitação e votação não foi simples. O final do mês passado, o presidente Jair Bolsonaro fez 38 vetos ao projeto da Lei sobre Abuso de Autoridade. O plenário do Congresso Nacional reagiu e derrubou 18 itens dos 33 vetos. Com isso, os trechos vetados por Bolsonaro e recuperados pelos parlamentares serão incorporados à legislação quando foram promulgados e publicados no "Diário Oficial da União".
Para a oposição do governo no Congresso, a decisão impôs derrota ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato que, “em conluio com procuradores, teria cometido várias ilegalidades que a Lei agora pretende coibir”. Sérgio Moro se empenhou diretamente para edição e manutenção dos vetos. Os 15 vetos mantidos na Lei do Abuso de Autoridade foram patrocinados pelo Senado.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia negou que o Congresso tenha adotado uma postura de enfrentamento e disse que mantém diálogo aberto com o ministro Sérgio Moro. “A Câmara e o Senado não podem votar projetos ou vetos contra ninguém”, disse. Maia destacou que a proposta da Lei de Abuso é aplicada a todas as autoridades brasileiras, de todas as esferas de poder: todos os agentes públicos de todos os Poderes precisam respeitar os limites da lei", disse.
O ministro Moro, pela Folha de São Paulo (24.10) disse lamentar “o ocorrido (os vetos) mas cumpre de minha parte respeitar a votação”.
Para o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), “o parlamento reafirmou seu papel e sua independência. Ao mesmo tempo, deu um passo importante para a salvaguarda do Estado Democrático de Direito contra o avanço do arbítrio”. “Aqui não estamos falando simplesmente dos chamados crimes do colarinho-branco. É o trabalhador que mora na favela, é o cidadão comum que no dia a dia é vítima dessa arrogância, dessa prepotência e desse abuso. Isso é também para aqueles que, ao longo desse último período, abusaram das suas prerrogativas para promover no Brasil a criminalização da política”, argumentou Orlando Silva.
O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), disse que tem a convicção de que o projeto sairá do parlamento como o instrumento para coibir a prepotência, a arrogância, o abuso cometido no dia a dia contra a população brasileira.
OAB X ANFIP
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) comemorou a derrubada de vetos à lei de abusos de autoridade e ressaltou que o Congresso Nacional deu grande demonstração de independência e compromisso com a sociedade brasileira, ao derrubar os principais vetos do executivo à lei de abuso de autoridade.
A OAB ao agradecer, em nome da advocacia, aos deputados e senadores pela derrubada de vetos, considerou a atitude como “ passo civilizatório importante”.
“A manutenção, na lei, da criminalização da violação das prerrogativas do advogado é uma vitória histórica da advocacia. Mas é, sobretudo, uma conquista da sociedade, já que o advogado, indispensável à administração da Justiça, precisa de instrumentos para que a defesa tenha paridade de armas para que a justiça se realize de forma equilibrada”, diz a entidade. Trata-se, portanto, segundo a entidade, de preservar e garantir o direito do cidadão diante de eventual abuso da força por um agente do Estado. A nova legislação vale para todas as autoridades, seja do Judiciário, do Executivo, ou do Legislativo, e significa a subordinação de todos, inclusive dos mais poderosos, ao império da lei. “A OAB, que tem como missão fundamental a defesa do Estado Democrático de Direito, enxerga nessa importante atualização legislativa um grande avanço para as garantias individuais, para a democracia e para a segurança jurídica”, finalizou.
ANFIP protocola ADI contra Lei No dia 14.10, a ANFIP distribuiu Ação Direta de Inconstitucionalidade em defesa dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil e contra a Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019), que criminaliza atos praticados por agente público.
A ADI aponta que os artigos 27, 29 e 31, da referida lei, restringem e colocam obstáculos para o exercício pleno da atividade fiscal, tendo em vista que os mencionados dispositivos criminalizam a autuação legal por parte dos Auditores Fiscais.
Ao entender que artigos da lei inviabilizam hoje a atuação do Auditor Fiscal, a associação aponta na Ação Direta de Inconstitucionalidade que há colisão de princípios constitucionais sensíveis quanto à administração pública tributária, o que torna necessária a análise dos dispositivos questionados no campo da razoabilidade e proporcionalidade para que de forma constitucional interajam com os demais dispositivos normativos.
SAIBA MAIS
Tramitação da Lei
Aprovada pelo Congresso Nacional em agosto de 2019, a lei foi sancionada em setembro deste ano pelo presidente Jair Bolsonaro. No fim de setembro, o Plenário do Congresso Nacional derrubou 18 itens dos 33 vetados.
Votação
Na Câmara dos Deputados, o placar a favor da derrubada variou de 267 a 313 votos e, no Senado, de 41 a 56 votos. Em relação a todos os crimes previstos na lei, os parlamentares retomaram a previsão de que eles são de ação penal pública incondicionada, admitindo-se a ação privada se a ação penal pública não for proposta no prazo legal.
O Ministério Público deverá aditar a queixa, recusá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante (autor da queixa), retomar a ação como parte principal. A ação privada subsidiária deve ser exercida no prazo de seis meses, contado da data em que se esgotar o prazo para oferecimento da denúncia.
Confira os vetos rejeitados
Com a derrubada dos vetos, retornarão ao texto da Lei 13.869/19 os seguintes crimes:
- o responsável pelas investigações que, por meio de comunicação, inclusive rede social, antecipar atribuição de culpa antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;
- decretar prisão sem conformidade com as hipóteses legais. Válido também para o juiz que, dentro de prazo razoável, deixar de relaxar a prisão manifestamente ilegal; deixar de substituir a prisão preventiva por medida cautelar ou conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível; ou deixar de deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;
- constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro: pena de detenção de 1 a 4 anos, e multa, sem prejuízo da pena cominada à violência;
- violar direito ou prerrogativa de advogado como a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho e sigilo de comunicação; a comunicação com seus clientes; a presença de representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) quando preso em flagrante por motivo ligado ao exercício da advocacia; e prisão temporária especial: pena de detenção de 3 meses a 1 ano;
- deixar de se identificar ou se identificar falsamente ao preso quando de sua prisão. Aplica-se também para quem, como responsável por interrogatório, deixa de se identificar ao preso ou atribui a si mesmo falsa identidade, cargo ou função: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;
- prosseguir com o interrogatório de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio ou de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor público: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;
- impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado. Aplica-se a pena também a quem impede o preso, o réu solto ou o investigado de entrevistar-se pessoal e reservadamente com seu advogado ou defensor, por prazo razoável, antes de audiência judicial, e de sentar-se ao seu lado e com ele se comunicar durante a audiência, salvo no curso de interrogatório ou no caso de audiência realizada por videoconferência: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;
- dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;
- negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa; ou impedir a obtenção de cópias: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa.
Veja, abaixo, como ficará a nova lei de abuso de autoridade:
O projeto
A proposta estabelece uma série de crimes relacionados à atuação de servidores e de integrantes dos Três Poderes, que podem ser considerados como abuso de autoridade, além de determinar a forma como vai ocorrer o processo penal, a responsabilização e os efeitos da condenação pelas infrações.
Autoridades envolvidas
O texto estabelece quais agentes públicos da União, estados, Distrito Federal e municípios, da administração direta ou indireta, são capazes de cometer o crime de abuso de autoridade. Entre eles, então:
- servidores públicos e militares;
- integrantes do Poder Legislativo (deputados e senadores, por exemplo, no nível federal);
- integrantes do Poder Executivo (presidente da República, governadores e prefeitos);
- integrantes do Poder Judiciário (juízes de primeira instância, desembargadores de tribunais, ministros de tribunais superiores);
- integrantes do Ministério Público (procuradores e promotores);
- integrantes de tribunais e conselhos de conta (ministros do TCU e integrantes de TCEs).
Crimes e penas
A proposta agora prevê as seguintes situações que podem ser enquadradas como crime:
Decretar medida de privação da liberdade (prisão, por exemplo) de forma expressamente contrária às situações previstas em lei – pena de um a quatro anos de detenção;
Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado manifestamente descabida ou sem prévia intimação de comparecimento ao juízo – pena de um a quatro anos de detenção;
Deixar injustificadamente de comunicar prisão em flagrante à autoridade judiciária no prazo legal – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a: exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública; ou submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei – pena de um a quatro anos de detenção;
Constranger a depor, sob ameaça de prisão, pessoa que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, deva guardar segredo ou resguardar sigilo – pena de um quatro anos de detenção;
Deixar de identificar-se ou identificar-se falsamente ao preso por ocasião de sua captura ou quando deva fazê-lo durante sua detenção ou prisão – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Submeter o preso a interrogatório policial durante o período de repouso noturno, salvo se capturado em flagrante delito ou se ele, devidamente assistido, consentir em prestar declarações – pena de seis meses a dois anos de detenção.
Impedir ou retardar, injustificadamente, o envio de pleito de preso à autoridade judiciária competente para a apreciação da legalidade de sua prisão ou das circunstâncias de sua custódia – pena de um a quatro anos de detenção;
Impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de confinamento – pena de um a quatro anos de detenção;
Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei – pena de um a quatro anos de detenção;
Inovar artificiosamente, no curso de diligência, de investigação ou de processo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de eximir-se de responsabilidade ou de responsabilizar criminalmente alguém ou agravar-lhe a responsabilidade – pena de um a quatro anos de detenção;
Constranger, sob violência ou grave ameaça, funcionário ou empregado de instituição hospitalar pública ou privada a admitir para tratamento pessoa cujo óbito já tenha ocorrido, com o fim de alterar local ou momento de crime, prejudicando sua apuração – pena de um a quatro anos de detenção;
Proceder à obtenção de prova, em procedimento de investigação ou fiscalização, por meio manifestamente ilícito – pena de um a quatro anos de detenção;
Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa – pena de seis meses a dois anos de detenção.
Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado – pena de um a quatro anos de detenção;
Prestar informação falsa sobre procedimento judicial, policial, fiscal ou administrativo com o fim de prejudicar interesse de investigado – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente – pena de um a quatro anos de detenção;
Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado ou fiscalizado – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível – pena de seis meses a dois anos de detenção.
Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou de não fazer, sem expresso amparo legal – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la – pena de um a quatro anos de detenção;
Demorar demasiada e injustificadamente no exame de processo de que tenha requerido vista em órgão colegiado, com o intuito de procrastinar seu andamento ou retardar o julgamento – pena de seis meses a dois anos de detenção;
Antecipar o responsável pelas investigações, por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação – pena de seis meses a dois anos de detenção.
Mudanças no Estatuto da Advocacia e da OAB
A norma inclui, no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dispositivo que torna crime "violar direito ou prerrogativas do advogado".
Entre essas prerrogativas, estão:
- a inviolabilidade do escritório ou local de trabalho;
- comunicação com os clientes;
- a presença de representante da OAB em caso de prisão do advogado.
- A pena é de três meses a um ano de detenção.
Interceptações telefônicas
A lei determina que é crime "realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, promover escuta ambiental ou quebrar segredo de Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena de dois a quatro anos de reclusão.
Ação penal por meio do MP
Os crimes de abuso de autoridade são de ação penal pública incondicionada. Isso significa que o Ministério Público é o responsável por ingressar com a ação na Justiça, sem depender da iniciativa da vítima.
Se não for proposta a ação pelo MP no prazo legal, a vítima pode propor uma queixa em até 6 meses, contado da data em que esgotar o prazo para oferecer a denúncia.
Efeitos da condenação
Uma vez condenada – e reincidente em crimes do mesmo tipo – a autoridade pode:
- ser obrigada a indenizar o dano pelo crime;
- ser inabilitada para o exercício de cargo, mandato, função pública por um período de um a cinco anos;
- perder o cargo, mandato ou função pública.
Penas restritivas de direitos
Condenados pelos crimes de abuso de autoridade podem cumprir penas restritivas de direitos, no lugar das punições com prisão, como:
- prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas;
- suspensão do exercício do cargo, função ou mandato pelo prazo de um a seis meses, com perdas dos vencimentos e das vantagens.